
A voz é uma das manifestações mais diretas e sensíveis do nosso mundo interno. Ela revela emoções, memórias, crenças, posturas corporais e modos de estar no mundo. Trabalhar a voz em contextos terapêuticos — especialmente em abordagens que integram corpo e mente — permite acessar camadas profundas da experiência emocional, promovendo desbloqueios, fortalecimento do self e expressão autêntica.
A voz como espelho do psiquismo
A voz não é apenas um som: é uma expressão somatopsíquica. Tremores, abafamentos, sussurros ou impostações exageradas podem refletir experiências emocionais não integradas, traumas de infância, vergonha internalizada ou medo de se expor. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) trabalha com a reestruturação desses esquemas cognitivos disfuncionais, permitindo que o sujeito reescreva a narrativa que sustenta sua expressão (Beck, 2011).
Quando associada ao uso consciente da voz, a TCC pode ampliar ainda mais os ganhos terapêuticos, promovendo um processo onde o pensamento reestruturado se torna som expressivo e vivido no corpo.
A voz na Análise Bioenergética: bloqueios e liberação
Na Análise Bioenergética, a voz é um veículo direto para o desbloqueio emocional. Segundo Lowen (1975), muitas contenções musculares — especialmente no pescoço, mandíbula e diafragma — estão associadas à inibição da expressão emocional. Exercícios de vibração sonora, grito consciente, sons vocálicos e respiração profunda ativam áreas de tensão e facilitam a liberação de afetos reprimidos (Resende & Dantas, 2019).
“A voz expressa aquilo que o corpo ainda não pode dizer com palavras.”
— Alexander Lowen
A identidade vocal: uma construção subjetiva
Na psicologia da música e nas práticas de musicoterapia vocal, a voz também é entendida como um traço da identidade. Trabalhar a relação do sujeito com sua voz é trabalhar sua autoimagem, seu lugar no mundo e seu direito de ocupar espaço com sua presença sonora. Austin (2008) chama esse processo de psicoterapia vocal, onde o som é usado como espelho e catalisador de transformação emocional.
A forma como alguém se ouve e se permite ser ouvido tem impacto direto sobre sua autoestima, sua comunicação interpessoal e sua vivência de pertencimento.
Canto lírico como caminho de reconstrução emocional
O canto lírico, ao exigir um alto grau de consciência corporal, controle respiratório e entrega emocional, se torna um território fértil para o autoconhecimento. Ao trabalhar repertórios intensamente expressivos (como nas árias de ópera), o sujeito entra em contato com emoções profundas de forma simbolicamente segura — o que pode ressignificar experiências e ampliar a capacidade de sentir sem ser dominado pelo afeto.
Além disso, o treino vocal consistente favorece a regulação do sistema nervoso, aumenta a capacidade pulmonar, melhora o tônus muscular e impacta positivamente o humor (Särkämö et al., 2014).
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Referências
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