
Durante este ano atuando como psicóloga de mulheres, pude observar o quanto elas são cobradas, não apenas externamente, mas também internamente. Tudo começa na infância, quando acabam sendo silenciadas, controladas e moldadas em sua forma de falar, sorrir, andar, vestir-se e até de pensar. No passado, as mães preparavam suas filhas para serem esposas, mães e donas de casa. As avós relatam que, desde muito novas, já organizavam seus enxovais, um costume profundamente enraizado. Os pais, por sua vez, decidiam com quem as filhas se casariam. Podemos observar isso nos clássicos filmes de princesas: o pai que entrega a filha para quitar uma dívida é o mesmo que organiza um banquete para conhecer o futuro marido dela. Em situações como essa, o bem-estar da noiva jamais é considerado, até porque, se fosse, ela não estaria se casando com um completo desconhecido.
As meninas que crescem assistindo a esse tipo de conteúdo acabam acreditando que isso é normal, que precisa ser assim, e exatamente nessa ordem. Perdem autonomia, perdem liberdade, perdem até mesmo o direito de ir e vir. Afinal, não podem escolher com quem se casar, nem se realmente desejam se casar.
Atualmente, embora muitas mulheres cheguem à adolescência sem um pretendente, a ideia da necessidade de “cumprir papéis” ainda é fortemente enraizada. Por isso, tantas chegam à vida adulta ansiosas por desempenhar todos os papéis impostos pela sociedade: ser mulher, feminina, dona de casa, cozinheira, esposa e mãe.
E, ainda assim, parece nunca ser o suficiente. Vejamos: se a mulher é solteira, logo é pressionada a casar, afinal, quem quer “ficar para titia”? Surge a pressão da idade, porque, para muitos, ainda é “aceitável” que uma menina de doze anos se case, mas inconcebível que uma mulher de trinta ainda não tenha se casado. E depois do casamento? A cobrança continua: “E os filhos?”. Como assim ela não quer ser mãe agora, ou talvez nunca? Afinal, dizem, “é tudo o que uma mulher precisa”.
É claro que estou sendo sarcástica, mas gostaria que fosse apenas ironia. A realidade mostra que, muitas vezes, a mulher não pode desejar, apenas servir. É tratada como um objeto que existe para satisfazer as expectativas alheias.
Quase todos conhecem a história da Cinderela. O ponto que quero destacar é o baile oferecido pelo príncipe para escolher sua futura esposa. Todas as mulheres do reino enxergam aquilo como uma oportunidade única e entram em desespero. É ali, de forma implícita, que se planta a rivalidade feminina. Nascem as comparações, como se todas estivessem em um campo de batalha. O sapatinho de cristal é delicado, e precisa de um pé igualmente delicado: reforça-se, mais uma vez, a ideia de que a mulher deve ser suave, dócil, frágil e estar sempre à espera de um príncipe que a salve.
A questão não é problematizar tudo, embora muitos ainda confundam o ato de questionar com “militar por tudo”, mas refletir criticamente: “Eu realmente quero isso, ou foi algo que me impuseram?”. Nos contos de fadas, raramente as protagonistas se apaixonam por homens comuns e gentis; o amor idealizado é sempre pelo príncipe, o rei, o herdeiro do trono. O problema não está em se apaixonar por alguém rico, mas em acreditar que a mulher não precisa de mais nada além disso.
Se analisarmos, o primeiro filme que foge parcialmente da lógica da riqueza, do status e da beleza idealizada é A Bela e a Fera, ainda assim, a Fera possui uma “misteriosa riqueza”. Isso significa que, antes da década de 1980, praticamente não existiam filmes de princesas que evitassem esse tema e mostrassem romances com pessoas comuns.
Sim, são apenas contos de fadas, com a intenção de representar finais felizes. Mas fica o questionamento: será que todas as princesas precisavam, necessariamente, desse final feliz?
Vocês precisam entender que a mídia é, sim, referência para muitas pessoas. É ali que grande parte do tempo é passada, especialmente na infância, e são justamente essas telas que acompanham o crescimento das crianças, reforçando e idealizando padrões como esses de forma constante.
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