
Vivemos em uma época em que a imagem parece tomar o lugar do vivido. O feed organizado, as fotos escolhidas, os stories planejados… Tudo nos convida a mostrar uma versão de nós mesmos que caiba em molduras digitais. Mas, se olharmos pela lente da psicanálise, percebemos que a vida real é muito mais vasta, complexa e contraditória do que qualquer tela pode conter.
O que sentimos nos bastidores, as alegrias silenciosas, as dúvidas, os medos, os momentos de tédio ou frustração, não cabe em uma foto ou legenda. Freud nos lembra que há um inconsciente que escapa à visibilidade, um espaço íntimo onde desejos e emoções se movimentam livremente, longe do olhar público. Winnicott, por sua vez, nos fala sobre a importância do “espaço potencial”, onde podemos ser nós mesmos sem a pressão de performar para os outros, onde a vida é sentida antes de ser mostrada.
A vida é pulsão, é processo, é aquilo que acontece entre os momentos fotografáveis. Ela é silêncio, emoção não verbalizada, choro que ninguém vê, riso que explode sem registro. Acolher essa ideia é se permitir sentir o que não cabe em post, se dar o direito de existir sem aprovação, de viver sem filtro. Afinal, a vida real é feita de instantes que escapam à moldura, e é justamente aí que mora sua beleza mais profunda.